24 outubro, 2010

Podes descer.

Estive, há 10 minutos atrás, na varanda do meu 5º andar, a observar a cúpula invisível entre o céu e o enorme lego de betão e a sentir-me um inquilino passageiro desta pensão de uma estrela, perdido na imensa cidade negra a que damos o nome do universo. Curiosamente parece que é o único sítio que temos para passar a longa noite que nos espera. E é ai que eu saio para apanhar a frequência, como que a comer um ponto e a cagar um verso. No meu prisma a encaixar, provavelmente no dos outros feitos um filósofo de merda. Mas, a vida é isso mesmo, um monte de gente a fazer de conta que se entende e ninguém sabe dizer o que viveu, por isso nos pedem que caminhemos alegres para o precipício sem questionar. Porque estaremos sempre longe, longe rapidamente fica perto e perto rapidamente passa por nós. Eu não quero mandar-te para baixo mas eu sei que me entendes. Tu também tens medo de morrer, toda a gente tem. Só que normalmente evocamos nomes de problemas para nos convencermos que estamos ocupados a resolver uma situação importante quando não tem importância nenhuma. Entretanto, o tapete rola, e nós irritamos-nos com a inevitabilidade e nos nossos sonhos dizemos: “ torna-me imortal, torna-me imortal, eu não vou aguentar deixar de existir”.
E é ai que eu entro, para sair da frequência, seduzir-te com os meus sonhos. Tu não vês como empreendo e como eu, mais um milhão de sonhadores, leva com ele muitos braços de outros acéfalos na lotaria dos ideais descrentes, beijando o número do bilhete. Mas, quero dizer-te que a viagem é tua e eu não quero empurrar-te á força para a rua. Se eu falhar, eu vou passar de Deus a carrasco, embalsamado e metido dentro de um frasco, para te lembrares da mentira mas, a verdade, é que ganhamos sempre.

Manel Cruz (Foge Foge Bandido)